segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Coisas de Ianques... Debate aberto!

Barack Obama e o império infante

Os Estados Unidos foram estabelecidos como um “império infante”. Não foi Chávez ou Chomsky quem disse, mas George Washington. A conquista do território nacional deu-se como uma grande empreitada imperial, e desse alicerce sedimentado pelos "founding fathers" os EUA não escaparam.
Nada como a combinação entre simbolismo e desejo (ou ingenuidade). Inibe a aceitação dos limites da mudança ou, no outro extremo, conduz à pressa na convicção de que se está diante de uma nova rota de fato. Tome-se o exemplo do presidente dos EUA, Barack Obama, e seus contraditórios movimentos retóricos e militares. De um lado, o chamamento à paz nas Nações Unidas [...] De outro, a conclamação ao combate ao terrorismo. A ênfase sobre o Afeganistão. A extensão de bases iraquianas. O acordo secreto com a Colômbia.

Esses dois cursos díspares ajudam a apontar o risco da projeção de expectativas exacerbadas sobre modificações de espetaculares consequências para o resto do mundo. Obama marca diferenças, é fato, em relação ao antecessor, mas nem nos EUA (nem no Brasil) presidentes fazem o que bem entendem. A política costuma ser bem mais racional e responsável do que supõem as torcidas passionais. Em matéria militar, no caso americano, isso é ainda mais cristalino. Nenhum presidente, mesmo o mais imperial, romperia de uma penada o apoio militar à Colômbia, tampouco abandonaria a defesa da tese das “fronteiras flexíveis”.

Há poucas semanas, o linguista Noam Chomsky escreveu um artigo no New York Times sobre a militarização da América Latina. Não só contabilizou as sete bases navais, aéreas e do Exército americano na Colômbia como mostrou a presença geral dos EUA na América Latina: as bases militares em Guantánamo (a mais conhecida), Honduras, El Salvador, Manta (Equador) e Aruba-Curaçao. São eixos do presente herdados de uma década de aumento da ajuda militar e de treinamento de oficiais latino-americanos, em táticas leves de infantaria para combater um “populismo radical” – conceito que, no contexto latino-americano, “provoca arrepios na espinha”, segundo Chomsky. “O treinamento militar está sendo transferido do Departamento de Estado para o Pentágono, eliminando regras quanto aos direitos humanos e a democracia antes sob a supervisão do Congresso que, embora fracas, pelo menos impediam algumas das piores violações”.
[...]
Expectativas que estejam movidas por desejo ou ingenuidade tendem a ignorar o fato de que os EUA foram estabelecidos como um “império infante”. Não foi Chávez ou Chomsky quem disse, mas George Washington. A conquista do território nacional deu-se como uma grande empreitada imperial, e desse alicerce sedimentado pelos founding fathers os EUA não escaparam. A questão é a força dos símbolos e a gradação das mudanças, dirão os entusiastas de Obama. Refutá-los seria brejeirice. O problema não é reconhecimento de que mudanças são, de fato, gradativas, mas a ilusão das expectativas excessivas (vide o debate nacional do primeiro mandato do presidente Lula, em que a esquerda histórica jogou a toalha contra a suposta submissão lulista na condução dos assuntos nacionais).

Ok, abaixo o niilismo, mas manter os olhos críticos ajuda a lembrar que, nos oito anos da administração de Bill Clinton – transformado na figura emblemática da vitória da democracia, do mercado e da paz –, os EUA se envolveram em 48 intervenções militares, contra 16 em toda a Guerra Fria. (Números de The new american militarism, do estrategista militar Andrew J. Bacevich – US$ 15 na Amazon). Dispensável lembrar que governos democratas progressistas patrocinaram o desastre da invasão de Cuba e a guerra do Vietnã. Os tempos são outros, a jornada Obama mal começou, os falcões continuarão à espreita, e o mundo, inquieto, continuará dividido. Entre simbolismos, desejos e realidade.

Rodrigo de Almeida é editorialista e colunista do Jornal do Brasil.
Fonte: http://www.cartamaior.com.br, de 27/9/09

Nota do Editor do DialogosenMercosur:
Para não dizer, neste post, que não lembramos da primavera, que não recordamos da Alice, aquela do País das Maravilhas e, lógico, do nosso americanista brasileiro, o pernambucano Sílvio Júlio de Albuquerque Lima, faremos duas citações com relação ao texto do Rodrigo de Almeida e de Chomsky às referências americanas: 1. Nosso próprio ponto de vista quanto ao poder do Império Infante, que extraio de um trecho do artigo "Silvio Júlio, um americanista brasileiro", que diz o seguinte sobre o tema: "Quando nasceu Sílvio Júlio de Albuquerque Lima em 1895, a época era conturbada para a América Latina. Fato relevante: Os Estados Unidos da América já tinham mostrado suas garras para los hermanos situados abaixo da linha do Equador, uma afirmação de poder que se dá na seqüência de ações anteriores de natureza semelhante. Já haviam comprado a Louisiana da França napoleônica (1803), anexado em 1845, o estado do Texas, e entre 1846 e 1848, o Arizona, a Califórnia, Nevada, Utah e Colorado, antigos territórios mexicanos, além do Alasca, adquirido da Rússia em 1867.
No contexto latino americano, de 1898 a 1902, os EUA ainda intervieram em Cuba, cujo interesse era assegurar os investimentos do empresariado americano no campo da produção açucareira, daí resultando a declaração de guerra à Espanha em 1898, o que levou, por sua vez, a obtenção das Filipinas, Porto Rico e Guam. Numa demonstração de poder e influência política, os yankees incentivaram o Panamá a separar-se da Colômbia, em 1903, rendendo desse apoio o domínio, por parte dos americanos, da Zona do Canal no ano seguinte. São Domingos sofreu intervenção americana de 1916 a 1924, o mesmo ocorrendo com o Haiti, de 1915 a 1936, e com a Nicarágua, de 1912 a 1933.
Com o poder de força, principalmente bélica e financeira, demonstrada aos demais países americanos, ao longo do período em que compunha os seus limites territoriais, os americanos passaram a dominar a região como um todo, influenciando ideologicamente até mesmo no processo de composição dessa “nova” América..." [...] O texto continua ...
2. Sílvio Júlio reproduzia em 1919, na obra Pampa, as seguintes palavras: "Tudo pelo extrangeiro, nada pelo nacional, eis a fórmula dos nossos presidentes. E assim vemos as levas YANKEES e de europeus gosando a fortuna fácil que lhes proporcionamos, enquanto o brasileiro aí jaz, geralmente pobre e abandonado”. ([...] O brasileiro deve ser contemplado antes do extrangeiro. É a lição que o extrangeiro dá ao brasileiro. Este methodo é Yankee e é europeu." (Pampa, 1919)
Será que mudou alguma coisa nos últimos 100 anos?

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